segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

Hino dos Reis Magos - Gonçalves Dias



(Tela de Vasco Fernandes - Grão Vasco)
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Entre a pobreza e a miséria
Em singela habitação

É nascido o Deus-Menino

Para a nossa salvação.
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Povos e reis, adorai-o,
É nascido o Redentor:

Vem viver, sofrer na terra
Vem morrer por nosso amor.
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Deixou a corte celeste

E as galas ricas dos céus,

Quem entre os homens é Homem,

Quem entre os anjos é Deus.
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Povos e reis, adorai-o,

É nascido o Redentor:

Vem viver, sofrer na terra,

Vem morrer por nosso amor.
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Lá das partes do Oriente,
Deixando os domínios seus,

Vêm os Magos pôr as c'roas,
Aos pés do Menino-Deus.
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Povos e reis, adorai-o,
É nascido o Redentor:

Vem viver, sofrer na terra,
Vem morrer por nosso amor.

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Vem of'recer os presentes

Que a Arábia Feliz produz.

Louvor a Deus nas alturas,

Louvor na terra a Jesus.
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Povos e reis, adorai-o,
É nascido o Redentor:
Vem viver, sofrer na terra,
Vem morrer por nosso amor.
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quinta-feira, 10 de dezembro de 2009

Cilada verbal - Affonso Romano de Sant' Anna



(Tela de Varatojo)
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Há vários modos de matar um homem:

com o tiro, a fome, a espada
ou com a palavra

– envenenada.
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Não é preciso força.

Basta que a boca solte
a frase engatilhada
e o outro morre
– na sintaxe da emboscada.
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quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

O apanhador de desperdícios - Manoel de Barros



(Tela de Portinari)
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Uso a palavra para compor meus silêncios.
Não gosto das palavras
fatigadas de informar.
Dou mais respeito
às que vivem de barriga no chão
tipo água, pedra, sapo.
Entendo bem o sotaque das águas.
Dou respeito às coisas desimportantes
e aos seres desimportantes.
Prezo insetos mais que aviões.
Prezo a velocidade
das tartarugas mais que a dos mísseis.
Tenho em mim esse atraso de nascença.
Eu fui aparelhado
para gostar de passarinhos.
Tenho abundância de ser feliz por isso.
Meu quintal é maior do que o mundo.
Sou um apanhador de desperdícios:
Amo os restos,
como as boas moscas.
Queria que a minha voz tivesse um formato de canto.
Porque eu não sou da informática:eu sou da invencionática.

Só uso a palavra para compor meus silêncios
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terça-feira, 8 de dezembro de 2009

Tempos e Momentos - Dária Farion



(Tela de W. Maguetas)
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Foram tantos os tempos
Foram tantos os momentos,
Acelerei na velocidade máxima
Vivi os tempos.
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Nem sempre consegui apreender os momentos:
Não lembro o sabor do primeiro cálice.
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Trago no peito a saudade da velocidade,
Piso bem de leve no acelerador
Para contemporizar o momento,
Retardar a despedida.
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Mas agora é o tempo que corre célere:
Aproxima-se veloz a linha da passagem.
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segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

Lilases - Pe. Alfredo Vieira de Freitas



(Tela de Neiva Passuello)
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Na primavera à luz do sol poente,
Ou nas lindas manhãs de céu de anil,
Reclinam-se os Lilases docemente,
Debruçados num gesto senhoril.
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Por eles vai passando toda a gente,
Mas os Lilases, num sonhar febril,
Apenas dão perfume ao ambiente
E ficam a cismar o mes de Abril.
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Tão tristes, são imagem da Saudade,
E fazem-me lembrar a mocidade . . .
Ilusões da minha alma sonhadora!
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As flores dos Lilases vão caindo! . . .
São as desilusões dum sonho lindo,
Dum sonho Lindo que sonhei outrora ! . . .
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sexta-feira, 4 de dezembro de 2009

Beleza - Menotti del Picchia



(Tela de Cézanne)
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A beleza das coisas te devasta
como o sol que fascina mas te cega.
Delas contundo a luminosa entrega
nunca se dá, melhor, nunca te basta.
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E a imensa paz que para além te arrasta
quanto mais se te esquiva ou te renega...
Paz tão do alto e paz dessa macega
que nos campos esplende à luz mais casta.
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A beleza te fere e todavia
afaga, uma emoção (sempre a primeira e nunca
repetida) que conduz
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o teu deslumbramento para um dia
à noite misturado, na clareira
em que te sentes noite em plena luz.
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quinta-feira, 3 de dezembro de 2009

Amigo - Roseana Murray


(Tela de Carl Larsson)
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que um amigo se reconheça
sempre
na face de outro amigo
e nesse espelho descanse
seus olhos
e derrame sua alma
como a crina de um cavalo
levemente pousada no tempo
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