sexta-feira, 29 de fevereiro de 2008

Ao Longe, ao Luar - Fernando Pessoa


Ao longe, ao luar,

No rio uma vela,

Serena a passar,

Que é que me revela?

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Não sei, mas meu ser

Tornou-se-me estranho,

E eu sonho sem ver

Os sonhos que tenho.

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Que angústia me enlaça?

Que amor não se explica?

É a vela que passa

Na noite que fica.

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(Tela de Antônio Hélio Cabral - Leitura)

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quinta-feira, 28 de fevereiro de 2008

Meus rabiscos...


Com Você

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Estar com você é como

irradiar raios solares,

pescar as estrelas do firmamento,

versejar colorido.

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É caminhar com os pés descalços

na relva fresca das emoções,

abraçar as nuvens,

assoprar bolinhas de sabão...

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É voltar a ser criança,

viver intensamente

cada instante como

sendo único...

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É reaprender a gostar,

voltar a planejar,

fechar os olhos e sonhar ...

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(Tela de João Baptista da Costa - Orquídeas)

quarta-feira, 27 de fevereiro de 2008

Propósito - Eunice Arruda


Viver pouco mas

viver muito

Ser todo o pensamento

Toda a esperança

Toda a alegria

ou angústia - mas ser

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Nunca morrer

enquanto viver

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(Tela de Enrico Bianco - Vaso com Flores)

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Poema retirado da Revista Vida Simples, Edição 46, Outubro 2006, p. 82

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terça-feira, 26 de fevereiro de 2008

Por Ricardo Reis


Da lâmpada nocturna

A chama estremece

E o quarto alto ondeia.

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Os deuses concedem

Aos seus calmos crentes

Que nunca lhes trema

A chama da vida

Perturbando o aspecto

Do que está em roda,

Mas firme e esguiada

Como preciosa

E antiga pedra,

Guarde a sua calma

Beleza contínua.

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(Tela de Tarsila do Amaral - Sol Poente)

segunda-feira, 25 de fevereiro de 2008

Haikais - Teruko Oda


Imensa quietude -

Ao ranger da porteira

canto do nambu.

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Notas diferentes

nos acordes do quintal -

Pardal de primavera.

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Cortem o pedaço

da nuvem que encobre o sol

tesouras-do-campo!

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(Tela de Neiva Passuello - Entre Liláses)

domingo, 24 de fevereiro de 2008

Estações - Rodrigo Petrônio


Um dia alguém vai ouvir

Esta brisa que ouço agora:

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Verga os galhos do plátano

Leva das mãos esta folha.

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Poema retirado da Revista Vida Simples, maio 2007, Edição 53, p. 82.


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sábado, 23 de fevereiro de 2008

Nunca Esqueça de Você... - Miro Julião


Nunca Esqueça de Você....

Esqueça os erros passados...
Mas nunca as lições aprendidas.

Esqueça os amores passados...
Mas nunca as emoções sentidas que deram vasão às alegrias vividas.

Esqueça as derrotas....
Mas lembra-te das grandes conquistas que te moldaram e te tornaram o que és hoje.

Esqueça as tristezas que tivestes...
Mas lembra-te das muitas alegrias que passastes.

Esqueça os sorrisos que dexastes de dar....
E lembre-se dos sorrisos amáveis que fornecestes.

Esqueça o tempo perdido....
Mas lembra-te do tempo que ganhaste ao realizar seus sonhos.

Esqueça as dores que sofrestes....
E lembra-te de quanta felicidade conquistastes.

Esqueça as dores do parto...
Mas lembra-te das alegrias que tua prole tem te proporcionado.

Agora se conseguir esquecer de tudo...
Nunca esqueça de VOCÊ!





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(Fotografia de Renata Christina)
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sexta-feira, 22 de fevereiro de 2008

Reflexão...


Eu fiz um acordo de coexistência pacífica com o tempo:

Nem ele me persegue; nem eu fujo dele.

Um dia a gente se encontra...

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(Mário Lago)


(Fotografia de Renata Christina)
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quinta-feira, 21 de fevereiro de 2008

Meus rabiscos ...




FRAGILIDADE


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Na corda bamba das emoções


enraízo sentimentos e expectativas.


Vivencio relacionamentos frágeis,


com expectativas de que


tornem-se duradouros.


Não limito a intensidade


do meu sentir, deveria?


Tenho medo das escolhas


que acabo fazendo.


Não posso deixar de pensar


na estabilidade que requeiro


para minha vida e meu coração.


O que mais necessito é


certeza quanto às escolhas e


saber que o tempo empreendido


reverterá em investimento.


Apenas isso, trará certamente


conforto para a alma


e alegria ao coração.

(Tela de Neiva Passuello -Meninas no Jardim - Série Meninas)
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quarta-feira, 20 de fevereiro de 2008

Meus Rabiscos ...


Renovação
..
Água corrente renovando a vida,

lavando a alma,

revigorando o coração,

com novos anseios,

novas paisagens

e concreta esperança

no dia de amanhã.
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(Fotografia de Leonor Cordeiro)

terça-feira, 19 de fevereiro de 2008

Por Clarice Lispector


Tente entender o que pinto e o que escrevo agora. Vou explicar: na pintura como na escritura procuro ver estritamente no momento em que vejo – e não ver através da memória de ter visto num instante passado. O instante é este. O instante é de uma iminência que me tira o fôlego. O instante é em si mesmo iminente. Ao mesmo tempo que eu o vivo, lanço-me na sua passagem para outro instante.

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(Tela de Clarice Lispector - Explosão)

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segunda-feira, 18 de fevereiro de 2008

História Universal - Antônio Mariano


Nunca soubemos
amar em pleno vôo
como as andorinhas
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que no auge do prazer
pairam e se absorvem
no antídoto dos instantes.
..
Então escolhemos
em vez do coito
(viveiro de constelações),
.
lágrimas nos olhos
e um banquete de asas.
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Retirado do livro Guarda-chuvas esquecidos - Editora Lamparina
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sábado, 16 de fevereiro de 2008

Solo de Clarineta - Adélia Prado


As pétalas da flor-seca, a sempre-viva,

do que mais gosto em flor.

Do seu grego existir de boniteza,

sua certa alegria.

É preciso ter morrido umaa vez e desejado

o que sobre as lápides está escrito

de repouso e descanso, pra amar seu duro odor

de retrato longínquo, seu humano conter-se.

As severas.

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(Tela de Tarsila do Amaral - Garimpeiro)

sexta-feira, 15 de fevereiro de 2008

Reverberação - Lya Luft


O destino trama os dias


e desfaz o sonho: demarca


meus contornos, partes


disso que sou e serei.


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Quem sabe desejei demais:


milagres não me bastaram,


mas quando eu quis ser rainha


fui simplesmente humana.


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A voz da vida insiste,


chama para o que salva


ou desatina:


nem sempre a entendi.


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Palavras buscam sentido


para o que fiz, falhei,


conquistei e perdi


- ou que me abandonou


nalguma esquina.


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(Talvez eu precisasse é dos silêncios)


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(Tela de Neiva Passuello - Passeio na Praia)


quinta-feira, 14 de fevereiro de 2008

O Haver - Vinícius de Moraes


Resta, acima de tudo, essa capacidade de ternura
Essa intimidade perfeita com o silêncio
Resta essa voz íntima pedindo perdão por tudo
-Perdoai-os! porque eles não têm culpa de ter nascido...
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Resta esse antigo respeito pela noite, esse falar baixo
Essa mão que tateia antes de ter, esse medo
De ferir tocando, essa forte mão de homem
Cheia de mansidão para com tudo quanto existe.
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Resta essa imobilidade, essa economia de gestos
Essa inércia cada vez maior diante do infinito
Essa gagueira infantil de quem quer exprimir o inexprimível
Essa irredutível recusa à poesia não vivida.
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Resta essa comunhão com os sons, esse sentimento
De matéria em repouso, essa angústia da simultaneidade
Do tempo, essa lenta decomposição poética
Em busca de uma só vida, uma só morte, um só Vinícius.
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Resta esse coração queimado como um círio
Numa catedral em ruínas, essa tristeza
Diante do cotidiano; ou essa súbita alegria
Ao ouvir passos na noite que se perdem sem história.
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Resta essa vontade de chorar diante da beleza
Essa cólera em face da injustiça e o mal-entendido
Essa imensa piedade de si mesmo, essa imensa
Piedade de si mesmo e de sua força inútil.
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Resta esse sentimento de infância subitamente desentranhado
De pequenos absurdos, essa capacidade
De rir à toa, esse ridículo desejo de ser útil
E essa coragem para comprometer-se sem necessidade.
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Resta essa distração, essa disponibilidade, essa vagueza
De quem sabe que tudo já foi como será no vir-a-ser
E ao mesmo tempo essa vontade de servir, essa
Contemporaneidade com o amanhã dos que não tiveram ontem nem hoje.
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Resta essa faculdade incoercível de sonhar
De transfigurar a realidade, dentro dessa incapacidade
De aceitá-la como é, e essa visão
Ampla dos acontecimentos, e essa impressionante
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E desnecessária paciência, e essa memória anterior
De mundos inexistentes, e esse heroísmo
Estático, e essa pequenina luz indecifrável
A que às vezes os poetas dão o nome de esperança.
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Resta esse desejo de sentir-se igual a todos
De refletir-se em olhares sem curiosidade e sem memória
Resta essa pobreza intrínseca, essa vaidade
De não querer ser príncipe senão de seu reino.
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Resta esse diálogo cotidiano com a morte, essa curiosidade
Pelo momento a vir, quando, apressada
Ela virá me anteabrir a porta como uma velha amante
Mas recuará em véus ao ver-me junto à bem-amada...
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Resta esse constante esforço para caminhar dentro do labirinto
Esse eterno levantar-se depois de cada queda
Essa busca de equilíbrio no fio da navalha
Essa terrível coragem diante do grande medo, e esse medo
Infantil de ter pequenas coragens.
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(Tela de Van Gogh - Cottages)

quarta-feira, 13 de fevereiro de 2008

Meus Rabiscos


Expectativas
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Criadas

Sonhadas

Batalhadas

Conquistadas

Dissipadas

Congeladas

Frustradas

Acabadas

Enterradas

até começar tudo de novo...
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(Obra de Edna Mara - Visão da Alma)

terça-feira, 12 de fevereiro de 2008

Se eu Fosse um Padre - Mário Quintana



Se eu fosse um padre, eu, nos meus sermões,

não falaria em Deus nem no Pecado —

muito menos no Anjo Rebelado

e os encantos das suas seduções,

não citaria santos e profetas:

nada das suas celestiais promessas

ou das suas terríveis maldições...

Se eu fosse um padre eu citaria os poetas,

Rezaria seus versos, os mais belos,

desses que desde a infância me embalaram

e quem me dera que alguns fossem meus!

Porque a poesia purifica a alma...

e um belo poema — ainda que de Deus se aparte —

um belo poema sempre leva a Deus!

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(Tela de Zanini - Figuras na Rua)

segunda-feira, 11 de fevereiro de 2008

Perdas Poéticas - Affonso Romano de Sant' Anna


Perco em média, três poemas por semana

por desatenção e desmazelo.

Ainda há pouco um solicitou-me a atenção

e perdulário fingi não vê-lo.

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Ah, o que perco por soberba

o que perco talvez por aceitar

o que eu mesmo me ofereço.

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Os que me vêem passar

me pensam rico, no entnato,

o que perdi não tinha preço.

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(Fotografia retirada de arquivo pessoal)

sexta-feira, 8 de fevereiro de 2008

Meus Rabiscos...


ANJO POETA

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Há poucos dias você chegou
De uma maneira sutil.

Consigo trouxe versos e canções
Enaltecendo a felicidade e a vida.
Derramou alegria em meu caminho,
Dando cor a meus dias
Envolveu-me com acordes de poesia
Improvisada e encantadora.
Ao escrever com entusiasmo,
Cativou minha alma e meu coração
Mudou o roteiro em cena.
Enfim, despertou-me novamente
Para a graciosidade do versejar.
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(Tela de Frida Khalo - Duas Fridas)

quinta-feira, 7 de fevereiro de 2008

Costuras - Doriana


A vida bordou surpresas em ponto agrilhão
Tecias auroras carsidas.
Desfiaste o tecido para o crivo; esqueceste chulear as baínhas.
Não pudeste atingir a perfeição dos deuses,
gostei do passajado feito quando tudo se desmanchou
Continuo trajando o vestido da tua oferta.
baloiça o tempo na folha da goiabeira
baloiça oh folha!
que o silêncio geométrico multiplica a esfera:
a noite aleita o traçado dos morcegos
sombras mudas enamoram açucenas
a memória afaga paralelos idos
e o corpo se desfaz em loiras labaredas.
balança o tempo nas folhas da minha terra,
balança oh terra!
já o meu corpo se desfaz na geografia da espera.
nômada
o adiante veste incógnitas de cristal
balança oh folha!
balança oh terra
queria ainda beijar-lhe a era.

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Doriana ou Dorina é o pseudônimo de Ana Francisca Silva Major.

Nasceu em Luanda, em 1958.


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(Tela de Van Gogh - Lillac Bush)

quarta-feira, 6 de fevereiro de 2008

Conselho - Helena Kolody


Como o raio de sol torna um quarto risonho,

Alegra o coração a eterna luz do sonho.

Se as sombras do caminho esperas dissipar,

Conserva dentro d'alma, eternamente erguida,

A lâmpada de um sonho, inquieto como a vida,

Alto como o infinito, imenso como o mar.
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(Di Cavalcanti - Família na Praia)

sexta-feira, 1 de fevereiro de 2008

Convite - Lya Luft


Não sou a areia

onde se desenha um par de asa

sou grades diante de uma janela.

Não sou apenas a pedra que rola

nas marés do mundo,

em cada praia renascendo outra.

Sou a orelha encostada na concha

da vida, sou construção e desmoronamento,

servo e senhor, e sou

mistério.

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A quatro mãos escrevemos este roteiro

para o palco de meu tempo:

o meu destino e eu.

Nem sempre estamos afinados,

nem sempre nos levamos

a sério.
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(Tela de Zanini - Marinha)